A queda do
avião de Eduardo Campos mal havia sido confirmada quando a Prefeitura de Santos
começou a receber políticos e jornalistas angustiados por informações.
Foto: MURILLO CONSTANTINO / AGÊNCIA O DIA |
Na
tarde da quarta-feira trágica, o local funcionou como quartel-general da crise,
com gente nervosa andando para lá e para cá, falando sem parar nos celulares,
quase todos tentando obter ou confirmar fragmentos de notícias.
Foi
para lá que a ex-senadora Marina Silva dirigiu-se para fazer seu pronunciamento
público de pesar.
A
chegada de Marina, circunspecta e visivelmente abalada, silenciou o ambiente.
"A
imagem que quero guardar dele é a da nossa despedida de ontem: cheio de
alegria, cheio de sonhos e cheio de compromissos", disse ela.
Ao
terminar, Marina levantou e caminhou em silêncio para fora do salão. Quando a
porta fechou, o falatório e a movimentação nervosa voltaram a tomar conta do
lugar.
A
reverência solene dos presentes diante de Marina explica-se por duas razões.
Primeiro,
por sua conhecida proximidade com Campos. Uma convivência política que se
intensificou há dez meses quando, esgotada a chance de oficialização do partido
Rede, ela surpreendeu até os mais próximos ao anunciar sua filiação ao PSB.
Segundo,
pelo ensejo político que a tragédia produziu. A morte súbita de Campos colocou
nas mãos de Marina a possibilidade de determinar o rumo da atual eleição.
Embora
não tenha relação fluida com caciques do PSB, o entendimento político que se
firmou é o de que Marina só não será candidata no lugar de Campos se não
quiser.
Mas
depois de passar meses tentando criar um partido para tal e ter feito a
arrojada operação que a colocou como vice de Campos, como iria explicar agora
que não quer?
Agraciada
com 19,6 milhões de votos em 2010, Marina sempre obteve melhor desempenho que
Campos nas pesquisas. Num período, isso chegou a ser visto como ameaça ao
presidenciável do PSB.
Nos
levantamentos do Datafolha que a incluíam no rol de possíveis candidatos,
Marina Silva aparecia invariavelmente em segundo lugar.
Em
abril, alcançava 27% , 11 pontos a frente do senador Aécio Neves (PSDB) e 12
pontos abaixo da presidente Dilma, que concorre à reeleição.
Na
época, a hipótese de viabilização da Rede Sustentabilidade ainda não havia sido
descartada. Marina era identificada como a única figura do sistema político
preservada (ou até beneficiada) dos enormes protestos que tomaram conta do país
em junho do ano passado.
REPETIÇÃO
Com
a volta de Marina para o centro da arena, a disputa de 2014 tende a ficar mais
parecida com a de 2010, com o possível retorno de temas que pautaram aquela
eleição. O aborto é um deles.
No
início da campanha de 2010, a evangélica Marina era a única constantemente
cobrada sobre isso. Ainda que sempre tenha cultivado a imagem de progressista,
ela é contrária à ampliação das situações em que a interrupção da gravidez é
permitida.
O
surpreendente crescimento de sua candidatura no final, combinado com uma entrevista
em que Dilma não deixava explícita sua posição, contribuiu para que o tema
aborto fosse alçado como principal assunto eleitoral.
Outro
tópico com potencial de ganhar impulso é meio ambiente, área em que também é
reconhecida pelas fortes convicções. Apesar de o governo Dilma ser severamente
criticado nesse setor, é um tema que seus rivais não vinham demonstrando muito
apetite para explorar.
Na
economia, a aproximação de Marina com economistas de pensamento liberal, como
André Lara Resende e Eduardo Giannetti, afastou dúvidas sobre como seria um
governo seu nessa área.
Seringueira
alfabetizada só aos 15 anos, discípula do ambientalista Chico Mendes,
assassinado no Estado do Acre em 1988, senadora negra, primeira ministra
nomeada pelo ex-presidente Lula em 2003, Marina sempre foi vista como uma
predestinada.
A
atual circunstância, fruto de nova tragédia, deve reforçar essa imagem. Se a
Rede tivesse sido viabilizada, ela provavelmente seria agora a candidata de uma
sigla nanica com tempo irrisório de propaganda na TV. Veja mais folha.uol