Até 12
mil pessoas podem morrer por fome diariamente, até o final de 2020, devido às
consequências da pandemia de covid-19 – mais do que pela doença em si –, alerta
a Oxfam no informe O Vírus da Fome: Como o coronavírus está potencializando a
fome em um mundo faminto lançado nesta quarta, dia 8 de julho.
O
documento revela como 122 milhões de pessoas podem ser levadas à beira da fome
este ano como resultado dos impactos sociais e econômicos causados pela
pandemia de coronavírus.
“A
covid-19 é a última gota para milhões de pessoas que já lutam dia após dia com
os impactos causados por conflitos armados, mudança climática, desigualdades e
um sistema viciado de produção de alimentos, que permitiu que os 8 maiores
fabricantes de alimentos e bebidas pagassem mais de US$ 18 bilhões a acionistas
desde janeiro último, conforme a pandemia se espalhava pelo mundo. Esse valor é
10 vezes maior que a quantia que a ONU diz ser necessária para acabar com a
fome no planeta”, afirma Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil.
No
Brasil, milhões de trabalhadores em situação de pobreza, sem recursos para se
protegerem durante o necessário período de distanciamento social, perderam sua
renda devido à pandemia. Apenas 10% do auxílio financeiro prometido pelo
governo federal aos trabalhadores e às empresas, via o Programa Emergencial de
Suporte ao Emprego (PESE), foi distribuído até junho. Enquanto isso, grandes
empresas obtiveram mais benefícios do governo do que trabalhadores e micro e
pequenas empresas. Ainda, 47,9% do montante destinado ao auxílio emergencial às
pessoas em situação de vulnerabilidade foi distribuído até início de julho.
“Os
riscos de disparada da fome no país são imensos quando o Estado brasileiro
falha em garantir as condições mínimas de sobrevivência a todas as pessoas
impactadas pela pandemia. Não basta criar programas de proteção, o que muda a
vida das pessoas é fazer os recursos chegarem na ponta”, diz Maitê Gauto,
Gerente de Programas e Campanhas da Oxfam Brasil.
O
Brasil está entre os prováveis epicentros da fome no mundo, juntamente com
Índia e África do Sul, onde milhões de pessoas estão à beira da grave
insegurança alimentar e pobreza extrema.
“Em
2014, o Brasil saiu do Mapa da Fome da FAO e essa foi uma grande conquista
nacional. Não podemos ser negligentes e não tomar todas as medidas para prevenir
a escalada da fome no país, durante e depois que a epidemia passar”, afirma
Gauto.
Mulheres são as que mais sofrem
com a fome
No
mundo, as mulheres, que em geral desempenham papel crucial como trabalhadoras
rurais e produtoras de alimentos, são as que mais correm risco de passar fome.
Elas já são vulneráveis devido à discriminação sistêmica, que faz com que elas
recebam menos do que homens pelo mesmo trabalho e detenham menor posse de terra
do que eles. As mulheres também são maioria no grupo de trabalhadores
informais, que no Brasil representa cerca de 40% da população economicamente
ativa e que estão sofrendo as maiores consequências econômicas da
pandemia.
“Os
governos têm que conter o avanço dessa doença mortal, mas é vital também que
tomem iniciativas para impedir que a pandemia mate ainda mais pessoas de fome”,
afirma Maia. “Os governos podem salvar vidas agora financiando o apelo covid-19
da ONU e cancelando as dívidas de países em desenvolvimento para liberá-los a
investir em redes de segurança social.”
Notas para o editor
Os
10 países que são centros da fome extrema no mundo hoje: Iêmen, República
Democrática do Congo (RDC), Afeganistão, Venezuela, Sahel da África Ocidental,
Etiópia, Sudão, Sudão do Sul, Síria e Haiti.
O
Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU estima que o número de pessoas em
nível de crise de fome – definida como nível 3 da Classificação Integrada de Fases
da Segurança Alimentar (IPC) da ONU – aumentará em cerca de 121 milhões de
pessoas este ano como resultado dos impactos socioeconômicos da pandemia. A
taxa de mortalidade diária estimada para o IPC a partir do nível 3 é de 0,5 – 1
a cada 10 mil pessoas, equivalente a 6.050 – 12.100 mortes por dia devido à
fome como resultado da pandemia até o fim de 2020. A taxa de mortalidade diária
observada globalmente para a covid-19 teve pico em abril de 2020 com pouco mais
de 10 mil mortes por dia, e ficou aproximadamente entre 5 mil e 7 mil mortes
diárias nos meses seguintes de acordo com dados da John Hopkins
University.
Ainda
que não seja possível ter certeza sobre projeções futuras, se não houver alteração
significativa dessas tendências até o final do ano, e se as estimativas do PMA
da ONU para o aumento do número de pessoas em crise alimentar se sustentarem, é
bastante provável que as mortes diárias por fome como resultado dos impactos
socioeconômicos da pandemia sejam maiores do que aquelas provocadas pela doença
no mundo até o final de 2020. É importante frisar que há alguma sobreposição
entre esses números porque algumas mortes provocadas pela covid-19 serão
ligadas à má nutrição. Com informações da Oxfam / Brasil247 / Arnaldo Carvalho - Guaribas-PI