O dia 19 de abril ficou conhecido no Brasil todo como o "Dia do Índio". A seguir, entenda sua origem e por que o uso do termo hoje é criticado.
A origem da data remete a um protesto dos povos indígenas do
continente americano ainda na década de 1940, quando um congresso organizado no
México se propôs a debater medidas para proteger os índios no território.
O Congresso Indigenista
Interamericano, realizado em Patzcuaro, aconteceu entre os dias 14 e 24 de
abril de 1940.
Em princípio, os representantes indígenas haviam se negado a
participar do evento, achando que não teriam voz ou vez nas reuniões - que
seriam comandadas por líderes políticos dos países participantes. Os índios,
então, fizeram um boicote nos primeiros dias, mas, justamente no dia 19 de
abril, decidiram aparecer no congresso para tomar parte nas discussões.
Foi por conta disso que a data escolhida para celebrar o dia do
índio acabou sendo essa.
Eram 55 delegações oficiais no México. Das Américas, somente
Paraguai, Haiti e Canadá ficaram de fora. Entre os índios, eram 47
representantes dos povos de todo o continente - no caso do Brasil, o delegado
enviado foi Edgar Roquette-Pinto, que não era índio, mas foi antropólogo,
etnólogo e estudioso de povos indígenas da Serra do Norte, na Amazônia.
Com o fim do Congresso, foram definidas algumas medidas
genéricas a serem tomadas em favor da defesa dos povos indígenas. Entre elas,
estavam o "respeito à igualdade de direitos e oportunidades para todos os
grupos da população da América", "respeito por valores positivos de
sua identidade histórica e cultural a fim de melhorar situação econômica",
"adoção do indigenismo como política de Estado", e, por último,
estabelecer "o Dia do Aborígene Americano em 19 de abril".
Não foram todos os países que adotaram a data como dia de
celebração da cultura indígena - e no Brasil ele também levou tempo a ser
oficializado, já que o país não aderiu às deliberações do congresso.
Somente em 1943 foi instituído decreto-lei
instituído pelo presidente Getúlio Vargas, que finalmente estabeleceu a data
comemorativa. O responsável por convencê-lo foi o general Marechal Rondon - que
tinha origem indígena por seus bisavós e chegou a criar, em 1910, o Serviço de
Proteção ao Índio - que depois viria a se tornar a atual Funai (Fundação
Nacional do Índio).
"O Presidente
da República, usando da atribuição que lhe confere o art. 180 da Constituição,
e tendo em vista que o Primeiro Congresso Indigenista Interamericano, reunido
no México, em 1940, propôs aos países da América a adoção da data de 19 de
abril para o 'Dia do Índio', decreta:
Art. 1º -
considerado - 'Dia do Índio' - a data de 19 de abril.
Art. 2º- Revogam-se
as disposições em contrário", dizia o decreto.
Além do Brasil,
Costa Rica e Argentina também adotaram a data.
Do Congresso, saiu
também a criação do Instituto Indigenista Interamericano, que se tornou um
órgão vinculado à OEA (Organização dos Estados Americanos) em 1953. Depois
dele, aconteceram mais 11 edições, sendo a última em 1999, na Cidade do México.
'Dia da Diversidade Indígena'
O uso do termo
"índio", no entanto, é criticado por lideranças dessa área. Doutor em
educação pela Universidade de São Paulo e pós-doutor em Linguística pela
Universidade Federal de São Carlos, Daniel Munduruku defende que a palavra
"índio" remonta a preconceitos - por exemplo, a ideia de que o
indígena é selvagem e um ser do passado - além de "esconder toda a
diversidade dos povos indígenas".
Por isso, "quando a gente comemora o Dia do Índio, estamos comemorando uma ficção", fala Munduruku, a respeito do 19 de abril. Reflexo disso são celebrações da data feitas por escolas, com uma "figura com duas pinturas no rosto e uma pena na cabeça, que mora em uma oca em forma de triângulo". "É uma ideia folclórica e preconceituosa."
"A palavra 'indígena' diz muito mais a nosso respeito do que a palavra 'índio'. Indígena quer dizer originário, aquele que está ali antes dos outros", defende Munduruku, que pertence ao povo indígena de mesmo nome, hoje situado em regiões do Pará, Amazonas e Mato Grosso.
"Talvez o 19 de abril devesse ser chamado de Dia da Diversidade Indígena. As pessoas acham que é só uma questão de ser politicamente correto. Mas, para quem lida com palavra, sabe a força que a palavra tem", continua o escritor, autor de mais de 50 livros para crianças, jovens e educadores. Informações, Terra / Cacique Raoni Metuktire / Foto: Geraldo Magela/Agência Senado