O site Intercept publicou na noite desta terça-feira (18) novas
mensagens atribuídas ao então juiz Sérgio Moro e a procuradores da
Operação Lava Jato.
O diálogo, segundo o site, teria ocorrido em 13 de abril de 2017, um dia
depois de o Jornal Nacional ter veiculado uma reportagem a respeito de
suspeitas contra o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
A reportagem citada pelo site foi publicada no JN de 12 de abril e
trouxe a delação de Emilio Odebrecht, que contou ter pago caixa dois às campanhas
de FHC nos anos 1990 --ele foi eleito presidente em 1994 e reeleito em 1998.
O caso foi parar na Lava Jato de São Paulo e nunca passou pela avaliação
nem do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato no
Paraná, nem do então juiz Sérgio Moro.
Segundo o site, Moro teria manifestado contrariedade com a decisão de
investigar o caso em São Paulo mesmo já estando provavelmente prescrito porque
isso melindraria "alguém cujo apoio é importante".
O diálogo publicado pelo Intercept começa com uma mensagem atribuída a
Moro e dirigida a Dallagnol. Eles conversam sobre o caso envolvendo FHC, que
havia sido encaminhado de Brasília, onde tramitava, para a Lava Jato de São
Paulo.
Moro – 09:07:39 – Tem alguma coisa mesmo séria do FHC? O que vi
na TV pareceu muito fraco?
Moro – 09:08:18 – Caixa 2 de 96?
Dallagnol – 10:50:42 – Em pp [princípio] sim, o que
tem é mto fraco
Moro – 11:35:19 – Não estaria mais do que prescrito?
Dallagnol – 13:26:42 – Foi enviado pra SP sem se analisar
prescrição
Dallagnol – 13:27:27 – Suponho que de propósito. Talvez para
passar recado de imparcialidade
Moro – 13:52:51 – Ah, não sei. Acho questionável pois melindra
alguém cujo apoio é importante
Segundo o site, o depoimento de Emílio Odebrecht permaneceu em segredo
de Justiça até abril de 2017, quando foi enviado para ser investigado pela
Procuradoria da República em São Paulo e virou notícia. Mas já nasceu morto: os
fatos estavam prescritos e a investigação foi arquivada pela Justiça três meses
depois.
A Justiça Federal arquivou em 5 de julho de 2017 a investigação
sobre FHC. O juiz acolheu pedido do Ministério Público Federal, que pediu
arquivamento argumentando que o crime prescreveu.
"(...) É fato notório que o representado Fernando Henrique Cardoso
possui mais de 70 anos, de sorte que se deve aplicar o disposto no artigo 115
do Código Penal, diminuindo pela metade o prazo acima mencionado. Decorridos
mais de 10 anos das datas dos fatos, quais sejam, as campanhas eleitorais nos
anos de 1993 e 1997 e não havendo causa interruptiva desse prazo até o presente
momento, é de se reconhecer a prescrição", escreveu na sentença, na
ocasião, o juiz Márcio Assad Guardia.
O que dizem Moro, MPF e FHC
Em nota, a assessoria do atual ministro da Justiça e ex-juiz Sérgio Moro
disse:
"O Ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, não
reconhece a autenticidade de supostas mensagens obtidas por meios criminosos,
que podem ter sido editadas e manipuladas, e que teriam sido transmitidas há
dois ou três anos.
Nunca houve interferência no suposto caso envolvendo o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso, que foi remetido diretamente pelo Supremo Tribunal
Federal a outro Juízo, tendo este reconhecido a prescrição.
A atuação do Ministro como juiz federal sempre se pautou pela aplicação
correta da lei a casos de corrupção e lavagem de dinheiro.
As conclusões da matéria veiculada pelo site Intercept sequer são
autorizadas pelo próprio texto das supostas mensagens, sendo mero
sensacionalismo".
Em nota, o Ministério Público Federal em Curitiba informou:
"A força-tarefa do Ministério Público Federal no Paraná (MPF/PR)
vem a público repudiar o ataque infundado à imparcialidade da operação Lava
Jato por meio de publicação equivocada e sem checagem dos fatos pelo site 'The
Intercept Brasil'.
Conforme é público, em relação ao ex-presidente Fernando Henrique, a
Petição nº 6794 foi apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao
Supremo Tribunal Federal (STF) e foi encaminhada por essa Corte à Justiça
Federal de São Paulo. Ou seja, o caso sequer era de atribuição da força-tarefa
Lava Jato de Curitiba e ela não teve qualquer participação na decisão de seu
envio para outra unidade do Ministério Público Federal ou na análise de
eventual prescrição.
Sempre que a força-tarefa tomou conhecimento de fatos que poderiam
revelar indícios concretos de crimes envolvendo altas autoridades,
independentemente do partido a que pertencessem, foram adotadas todas as
providências cabíveis.
A publicação, de modo tendencioso, para criar artificialmente uma
realidade inexistente que dê suporte a teses que favoreçam o ex-presidente
Lula, deixa de reportar a seus leitores o que é fato.
Conforme é público e notório, e pode ser confirmado no site da operação
(http://www.mpf.mp.br/grandes-casos/caso-lava-jato), a força-tarefa já realizou
mais de 60 fases ostensivas de investigação, ofereceu mais de 90 denúncias, e
participou da celebração de mais de 100 acordos de colaboração premiada que
revelaram a participação criminosa de pessoas ligadas a mais de 20 legendas
partidárias.
A operação Lava Jato se expandiu para outras instâncias e localidades no
País. Como exemplo, no STF, a partir de investigações da força-tarefa de
Curitiba, foram homologados acordos de colaboração de mais de 70 executivos do
Grupo Odebrecht. Somente nesse caso, houve a indicação de centenas de condutas
criminosas de mais de 400 agentes públicos, tendo sido nomeados políticos de 26
partidos.
Chama a atenção que o site 'The Intercept Brasil' continua a fabricar
narrativa política-partidária a partir de diálogos cuja a autenticidade e
integridade insiste em não submeter à comprovação. Além de tentar alardear
supostos conteúdos bombásticos obtidos a partir de suposto hackeamento ilícito,
não consegue minimamente atingir a expectativa criada, uma vez que nem o
contexto criado se refere à atuação direta da força-tarefa de Curitiba, e que
sua suposta versão não resiste a uma mínima análise crítica diante do contexto
da atuação dos procuradores e da Justiça.
No material publicado nesta terça-feira, 18 de junho, cuja
autenticidade, reforce-se, não pode ser confirmada, e que foi classificado como
'revelação mais grave até agora' pelo jornalista Glenn Greenwald em sua conta
na rede social Twitter, resta clara a ausência de qualquer elemento que indique
ação no sentido de forjar provas, ajuste partidário, manifestação de cunho
ideológico, corrupção, ou ilegalidade dos membros do Ministério Público
Federal, o que reforça o aparente intuito de as publicações objetivarem
distorcer supostas conversas entre autoridades, atacando o Sistema de Justiça e
as instituições da República, na mesma linha do que verificado nos ataques
cibernéticos. Suposta conversa sequer seria sobre fatos e procedimentos de
responsabilidade da força-tarefa ou da Justiça Federal em Curitiba, tal é a
falta de compreensão da realidade que o site estaria supostamente a reportar.
A força-tarefa do MPF/PR reafirma que a divulgação de supostos diálogos
obtidos por meio absolutamente ilícito, agravada por um contexto de sequestro
de contas virtuais, torna impossível aferir se houve edições, alterações,
acréscimos ou supressões no material alegadamente obtido. Além disso, diálogos
inteiros podem ter sido forjados pelo hacker ao se passar por autoridades e
seus interlocutores. Uma informação conseguida por um hackeamento ilegal traz
consigo dúvidas inafastáveis quanto à sua autenticidade, o que inevitavelmente
também dará vazão à divulgação de fake news.
Comentar supostos diálogos, documentos, informações – até para
esclarecer que não existiram -, serviria de incentivo à conduta dos criminosos
que delas se apropriaram, bem como daqueles que as publicam. Os ataques
cibernéticos a autoridades de diferentes instituições do País continuam, pelo
que, potencialmente, publicações na internet sobre supostos diálogos não se
restringem a conteúdo alegadamente obtido no passado, mas garantem visibilidade
a possível resultado de atos criminosos ainda em andamento.
Sem a comprovação de sua origem, autenticidade e contexto, a exposição
parcelada e contínua de supostos trechos de conversas atendem a uma agenda
político-partidária, em prejuízo do alegado interesse informativo e com a
intenção de manipular a opinião pública.
A superficial exploração sensacionalista de diversos episódios que
marcaram a operação Lava Jato tenta banalizar o esforço árduo de centenas de
servidores públicos, do Ministério Público Federal, Justiça Federal, Polícia
Federal, Receita Federal e tantos outros órgãos de Estado, e da própria
sociedade contra a corrupção."
Ao Intercept, o ex-presidente FHC disse, por meio de sua assessoria, que
não teve conhecimento de nenhum inquérito ou denúncia relacionados
à delação de Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobrás. Também afirmou
desconhecer as menções sobre seu filho e a compra de votos nas eleições – por
isso, “não sabe se teriam resultado em investigação ou denúncia”. A única
confirmada pelo ex-presidente foi a investigação que terminou arquivada.|G1/ O ministro Sérgio Moro, o procurador Deltan Dallagnol e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso — Foto: Isaac Amorim/MJSP; Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil; Wilson Dias/Agência Brasil