A Assembleia Nacional de Cuba se reúne
nesta quarta-feira (18) para
escolher o próximo presidente da ilha caribenha que, nas últimas seis décadas,
foi governada pelos irmãos Castro: Fidel, que morreu aos 90 anos, e Raúl, que
prometeu se aposentar aos 86. O novo líder será o primeiro, desde a Revolução
Cubana, com outro sobrenome e representando uma geração mais jovem do que
aquela que pegou em armas para derrubar a ditadura de Fulgencio Batista
(1952-1959) e desafiar os Estados Unidos (EUA), estabelecendo um regime
socialista a 150 quilômetros de sua costa.
O novo presidente de Cuba assume em um momento delicado. A
Venezuela, que fornece petróleo e sustentava o regime cubano, hoje enfrenta
grave crise econômica, marcada pela hiperinflação, o desabastecimento e o
isolamento internacional.
Com a mudança de governo em 2017, os Estados Unidos recuaram
no processo de reaproximação – primeiro passo para o fim do bloqueio econômico,
comercial e financeiro que continua impondo à ilha. O presidente
norte-americano, Donald Trump, (eleito também com o voto dos cubanos que
imigraram para os EUA e que exigem a derrubada do comunismo na ilha), limitou
viagens e investimentos (dos norte-americanos) em Cuba.
Raúl Castro diz que foi eleito presidente para “defender,
manter e continuar aperfeiçoando o socialismo cubano - e não para
destruí-lo”.
A eleição representa o fim de uma era, mas muitos
observadores acham que, na prática, pouca coisa mudará na vida dos 11,5 milhões
de cubanos: o Partido Comunista de Cuba (PCC) continua sendo o único e Raúl
Castro seu chefe.
“O Partido Comunista é o órgão máximo de decisão política,
de acordo com a Constituição cubana. Raúl Castro deixa a presidência do país,
mas não o cenário politico”, disse à Agência Brasil Erika Guevara-Rosas,
diretora para as Américas da Anistia Internacional, uma organização de defesa
dos direitos humanos. “Lamentavelmente, Cuba continua sendo um país que
violenta, de forma massiva, as liberdades civis, políticas e de expressão.”
Cuba é o único país do continente que não permite acesso oficial à Anistia
Internacional.
A expectativa é de que o cargo seja ocupado pelo atual
vice-presidente, Miguel Díaz-Canel, de 57 anos, que nasceu depois da revolução,
não usa farda, mas defende os ideais do Partido Comunista Cubano (PCC), onde
atua desde jovem. “Sou como muitos neste país”, disse Díaz-Canel. “Formamos
parte de uma geração que nasceu nos anos 60 e agradecemos muito toda a formação
e as possibilidades brindadas pela revolução. Tivemos a oportunidade de
participar dos processos de decisão nas organizações de base estudantis e da
juventude”.
Reformas
Só houve uma sucessão presidencial na Cuba revolucionária
e ela foi programada. Em 2006, Fidel Castro entregou o comando do país ao irmão
caçula – primeiro interinamente, depois oficialmente. Fidel estava doente e
morreu dez anos depois. Nos últimos 12 anos, Raúl Castro adotou algumas medidas
de abertura. Meio milhão de cubanos hoje trabalham no setor
privado. Desde 2013, quem quiser pode deixar o país, sem precisar de
autorização para viajar ou ter que fugir de barco, numa
perigosa travessia para a costa da Flórida. A compra e venda de imóveis e
carros, mesmo limitada, foi permitida. E a internet chegou à ilha, onde existem
mais de 600 áreas publicas com conexão wifi.
No cenário internacional, Cuba participou da 7ª Cúpula das
Américas em 2015. Foi a primeira reunião de líderes dos 35 países do Continente
Americano com a participação do governo cubano, que até então tinha sido vetada
pelos Estados Unidos. A notícia foi o histórico aperto de mão entre Raúl Castro
e o então presidente norte-americano, Barak Obama, marcando a reaproximação dos
dois países, depois de mais de meio século de guerra fria.
Apontada como responsável por disseminar revoluções
comunistas na região, Cuba patrocinou o acordo de paz entre o governo
colombiano de centro-direita, do presidente Juan Manuel Santos, e os rebeldes
das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Sete mil rebeldes
entregaram as armas, depois de 50 anos de conflito, para formar um partido
político, que este ano disputou as primeiras eleições legislativas.
Com a morte de Fidel em 2016, a pergunta era sobre o
futuro do país. Raúl Castro propôs ao partido limitar a idade (70 anos) e o
mandato (dois períodos de cinco anos) dos dirigentes do PCC, além de uma
reforma constitucional. E anunciou que deixaria a presidência, por decisão
própria, em abril deste ano.
Renovação
Para ex-combatentes da revolução, o sucessor de Raúl
Castro representa a renovação da cúpula do regime comunista cubano, mas a
continuidade de seus ideais. Alejandro Ferras Pellicer, de 94 anos, aposta nesta
nova geração que, ao contrário da anterior, nasceu com direito à educação e
que, segundo ele, estará mais preparada – intelectualmente e tecnologicamente -
para lutar por uma sociedade mais igualitária.
Raúl Castro sinalizou, em mais de uma ocasião, que a
ideologia não está em jogo – não importa quem seja o novo presidente de Cuba ou
que pressões ele terá de enfrentar. “O substituto de Fidel só pode ser o
Partido Comunista”, disse, quando os cubanos tentavam imaginar o futuro sem o
pai da revolução.
O analista politico cubano Rafael Hernández acredita que o novo governo
enfrentará pressões internas por mudanças, porque as expectativas de melhores
condições de vida vêm de longa data e cresceram com o tempo. Segundo ele,
apesar de Cuba enfrentar hoje uma conjuntura internacional menos favorável, a
ilha não está na mesma encruzilhada dos anos 90, quando a União Soviética
(principal fornecedora de petróleo a Cuba e financiadora de partidos comunistas
no hemisfério internacional) se dissolveu em 15 repúblicas separadas – entre
elas, a Rússia.
“Nesses 60 anos, Cuba demonstrou ser capaz de sobreviver a
várias crises – até à pior delas, nos anos 90, quando muitos pensavam que
ficaria isolada e seria obrigada a mudar”, disse, em entrevista à Agência Brasil, o analista político
argentino Rosendo Fraga. “Com a saída de Castro, uma nova geração subirá ao
poder. Mas a renovação será feita para manter o mesmo sistema em vigor”.|agenciabrasil / Foto reprodução - Internet