A procuradora-geral da República,
Raquel Dodge, afirmou em petição ao STF (Supremo Tribunal Federal) não ter
dúvida de que o atual ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes
(PSDB-SP), recebeu R$ 500 mil da Odebrecht em um
esquema para financiar sua campanha eleitoral de 2010.

Não
há registro na Justiça Eleitoral de doação oficial da Odebrecht para Aloysio na
disputa de 2010 ao Senado.
O
inquérito foi aberto em março a pedido do então procurador-geral Rodrigo Janot
como desdobramento do acordo de delação. Dois delatores da empreiteira
informaram à PGR sobre o pagamento a Aloysio.
Um
deles disse que repassou os dados sobre Aloysio ao "departamento da
propina" da empresa e fez duas entregas, de R$ 250 mil cada uma, para o
"representante" do candidato em hotéis da zona sul, não nominados, no
segundo semestre de 2010. No sistema de acompanhamento dos pagamentos, Aloysio
tinha o codinome "Manaus".
Ao
mesmo tempo em que apontou sua convicção sobre o repasse do dinheiro, Dodge
sinalizou que tanto Aloysio quanto o senador José Serra (PSDB-SP) poderão se
livrar de parte das investigações abertas. Os dois tucanos são investigados no
mesmo inquérito. Sobre Serra, pesam afirmações de delatoressobre pagamentos ilegais
em conexão com obras viárias no Estado de São Paulo.
Dodge
afirmou que os crimes atribuídos a ambos e cometidos antes de 2010 não deverão
ser mais objeto de investigação porque estariam prescritos —ou seja, o Estado
não poderia mais buscar a punição dos supostos autores.
Segundo
ela, o Código Penal "assegura aos senadores Serra e Aloysio prazo
prescricional pela metade, pois eles têm idade de 75 e 72 anos,
respectivamente". Embora tenha feito a observação, Dodge não pediu o
arquivamento das investigações.
Segundo
os delatores da Odebrecht, de 2004 a 2006 houve pagamentos irregulares a
campanhas de Serra de pelo menos R$ 9 milhões por meio de Paulo Vieira Souza,
conhecido como "Paulo Preto", então diretor da Dersa, estatal
paulista do setor viário.
O
cálculo da prescrição apresentado por Dodge, contudo, não atingiria outras
partes da investigação, como pagamentos durante a campanha presidencial de
Serra em 2010, incluindo 3,8 milhões de euros no exterior por meio de contas
indicadas pelo ex-deputado federal Ronaldo Cézar Coelho, e repasses de R$ 4,6
milhões para a campanha à Prefeitura de São Paulo em 2012.
Na
petição ao STF Dodge menciona uma manifestação da defesa de Aloysio que
ressaltou que dois dos delatores, em depoimentos que prestaram à Polícia
Federal, "declararam que as doações para a campanha" do atual
ministro "não foram condicionadas à prática de ato de ofício em favor da
empreiteira".
A
existência de um "ato de ofício", ou contrapartida, é considerada
fundamental nas investigações para diferenciar corrupção (pagamento de propina
em troca de vantagem para a empresa) de caixa dois (crime eleitoral).
Ao
pedir a continuidade das apurações, Dodge indicou que não está convicta sobre
"a finalidade do repasse".
Os
delatores que trataram do pagamento a Aloysio foram Carlos Armando Guedes
Paschoal, conhecido como CAP, e seu superior hierárquico, Benedicto da Silva
Júnior, o BJ.
Paschoal
afirmou que, ao assumir a função em São Paulo, em 2008, foi informado por outro
executivo "sobre um esquema de pagamentos de vantagem indevida
combinado" com Paulo Preto. Ambos disseram, contudo, que os pagamentos a
Aloysio não estavam ligados a esse esquema e que o senador não pediu uma
"contrapartida".
OUTRO LADO
A
defesa do ministro Aloysio Nunes afirmou que "não houve recursos de forma
ilícita para a campanha" em 2010. Segundo a defesa, a manifestação de
Dodge "se baseia apenas no que dois delatores falam", mas "não
há nenhuma comprovação" do pagamento de R$ 500 mil.
Em
petição ao STF em agosto, o advogado de Aloysio, José Roberto Santoro, pediu o
arquivamento do inquérito por ausência de "materialidade, tipicidade ou
qualquer outro indício que justifique a sua manutenção".
A
petição afirma ainda que o delator Carlos Armando Paschoal "deixou claro
que Aloysio 'nunca condicionou a resolução de problemas envolvendo obras da
Odebrecht ao pagamento de vantagem indevida ou mesmo a realização de doação
eleitoral', o que desde logo retira qualquer possibilidade de imputação diversa
daquela de falsidade ideológica eleitoral".
O
senador José Serra não comentará a manifestação de Dodge sobre a prescrição de
parte dos supostos crimes. O tucano tem negado irregularidades.
À
Polícia Federal, Paulo Vieira Souza negou ter participado de esquema para
pagamento de propina. Em janeiro, a defesa de Ronaldo Cézar Coelho disse que os
valores recebidos pelo seu cliente em conta na Suíça eram ressarcimento pelo
empréstimo de avião para uso na campanha presidencial de Serra.|folha