Os senadores aprovaram nesta
quarta-feira projeto de lei que aumenta de 33.000 para 39.000 reais o salário
dos ministros do Supremo Tribunal Federal e da procuradora-geral da
República. O impacto dessa medida vai muito além dos 11 juízes do STF: os
vencimentos dos membros da Suprema Corte balizam os salários de diversas
carreiras do setor público, razão pela qual o reajuste tem um efeito cascata. Segundo os cálculos da área técnica do
Senado, a despesa total decorrente da proposta chega a 5,3 bilhões de reais,
não retroativo. Com articulação pela manhã para a votação, o presidente
eleito Jair Bolsonaro se pronunciou, sem sucesso, contra
o aumento, que pode fragilizar ainda mais a situação fiscal da futura gestão. O
futuro mandatário fez questão de se mostrar contra uma alta extremamente
impopular em um contexto de lenta recuperação econômica, mas, poir outro lado,
se livrou do constrangimento de ter que decidir sobre o tema, que é de
interesse de todo o funcionalismo. O presidente Michel Temer, que tem de
sancionar ou não o aumento, é alvo agora de uma campanha nas redes sociais
contra a medida.
O aumento salarial foi apoiado
por 41 senadores, enquanto que 16 votaram não. Houve uma abstenção. A concessão
do aumento ocorreu nesta quarta após uma articulação liderada pela cúpula do
MDB no Senado. O presidente da Casa, Eunício Oliveira, colocou de última hora o
projeto na pauta, o que pegou muitos parlamentares de surpresa. Já a votação
final teve o endosse decisivo dos senadores Romero Jucá e do ex-presidente do
Senado, Renan Calheiros.
Coube a Jucá e a Calheiros —
que é o mais cotado para ser escolhido presidente do Senado no próximo ano —
defenderem publicamente a aprovação do projeto. Jucá, que não foi reeleito em
outubro, disse que o incremento salarial não traria um impacto fiscal para o
presidente eleito porque está em vigor uma emenda constitucional que limita o
gasto total do Governo. "Independente do projeto ser aprovado ou não, o
teto de gasto do Judiciário será cumprido no próximo ano. Não é verdade que
será criado despesa para o presidente Bolsonaro pagar", disse. Já Calheiros
afirmou que o aumento era necessário para "não trincar as relações entre
os poderes".
O projeto era uma demanda
antiga do Supremo. Lá, a justificativa é que o aumento já havia sido negociado
com os atuais presidentes da Câmara, do Senado e com o próprio presidente
Michel Temer. O reajuste seria ainda a condição para que os ministros acabem
com o auxílio-moradia, um benefício que alcança inclusive os magistrados que
têm imóvel próprio no seu local de trabalho e que também tem um custo
bilionário para os cofres públicos.
A promessa foi reafirmada por
Calheiros nesta quarta-feira, que disse na votação ter falado com os ministros
da Corte sobre o tema. "Dando um crédito de absoluta confiança ao Supremo,
de quem eu ouvi que vai acabar com o auxílio moradia e retirar outros
penduricalhos", disse o senador.
Revés
e desigualdade
Para além do reajuste dado à
magistratura, a aprovação nesta quarta também representou o primeiro revés do
presidente eleito Jair Bolsonaro no Congresso. Questionado sobre o tema, o
capitão reformado do Exército disse nesta quarta que não era o momento de dar
um reajuste que traria reflexos bilionários na folha de pagamento da União e
dos Estados. "Obviamente não é o momento. Nós estamos terminando um ano
com déficit, vamos começar o outro ano com déficit", disse Bolsonaro.
"Acho que estamos numa fase onde todo mundo tem ou ninguém tem. Nós
sabemos que o Judiciário é o mais bem aquinhoado entre os Poderes. A gente vê
com preocupação [o aumento salarial]", concluiu.
O futuro ministro da Economia
de Bolsonaro, Paulo Guedes, prevê realizar um duro ajuste fiscal no início do
mandato do presidente eleito.
A votação do aumento salarial
provocou duras reações de uma ala minoritária no Senado, que afirmou que era
inadmissível criar novas despesas num momento de crise das contas públicas.
"Essa votação é anacrônica com o momento atual do Brasil. Eu repercuto
aqui o pedido do presidente eleito. Não temos como votar essa matéria",
protestou o senador Randolfe Rodrigues.
Prevaleceu, no entanto, o
entendimento de que era melhor evitar o desgaste com a categoria de juízes do
país, que fez forte pressão para ver o reajuste aprovado. No Brasil, o novo
teto salarial para os juízes é 18 vezes o rendimento médio mensal (2.149
reais, segundo dados do IBGE), enquanto os juízes europeus ganham cerca de
quatro vezes a mais que a média salarial nacional, conforme um relatório do
Conselho da Europa baseado em dados de 2014. [r7 / Foto JEFFERSON RUDY AGÊNCIA SENADO]